segunda-feira, 16 de julho de 2012

Pai da Maçã dá adeus e volta à França



JUCIELE BALDISSARELLI
Repórter

Depois de dedicar mais de 50 anos para Fraiburgo, ficando conhecido como o Pai da Maça no Brasil, o francês Roger Biau dá adeus ao município e volta para o convívio familiar no sul França. Lá ficará na companhia de praticamente toda a família, inclusive de uma das filhas, Sophie. Com 82 anos, acometido de alguns problemas de saúde, como parkinson e problemas de coração, a difícil decisão demorou dois anos para ser tomada. Roger e a esposa Evelyne de 77 anos, entenderam que trata-se de um encerramento do ciclo de vida dedicado ao trabalho.
Na bagagem, que já está alto mar dentro de containers transportados por navio, o casal fez questão de levar cada objeto que tinham no apartamento, como forma de consolo para a saudade que deverão sentir. Além das roupas, objetos pessoais, até uma geladeira ganhou espaço para ser levada. Tudo será colocado na residência que o casal já possui na França e que vinha sendo preparada para recebê-los quando decidissem que era hora de partir. Já os franceses irão um pouco mais tarde, a viagem está agendada para a próxima quarta-feira (18). Em Fraiburgo deixam uma das filhas, Pascale a qual é casa e tem filhos.
 
Enquanto a data não chega, ambos aproveitam para se despedirem dos amigos e do município que muita consideração deve ter para com ambos. “É triste demais para mim, mas francamente fazem dois anos que toda manhã eu penso, vou reagir, mas esses problemas de saúde impossibilitam”, comentou. Mesmo com a idade avançada, Roger fazia questão de se manter pelo menos algumas horas por dia ativo profissionalmente. Costuma visitar os pomares de maçãs da empresa que criou, a Pomagri que atualmente é administrada pelo genro Pierre Nicolas Pérès. 
Nesse meio século de vida fraiburguense, talvez o mais difícil não tenham sido as pesquisas relacionadas à fruta, mas sim a adaptação à vida simples e sem nenhum conforto que o município pode oferecer a eles quando chegaram. Junto trouxe a esposa e as duas filhas, Sophie e Pascale que tinham três e quatro anos. Todos estavam acostumados a uma realidade muito diferente, afinal vinham da França, além do choque cultural, nem o português sabia falar.
Evelyne é notadamente reconhecida na sociedade local como uma mulher de gosto aprimorado, valiosa educação e delicadeza admirável. Quando se mudou para Fraiburgo em 1963 pensava que viria apenas passar uma temporada, no entanto os anos se passaram e nunca mais fora embora. Roger, além do amor, demonstra gratidão e admiração à esposa, pois sabe bem as dificuldades que ela teria enfrentado no começo de toda história. “Ela me dizia que eu era louco por enfrentar tal desafio, além das dificuldades materiais, parecia impossível implantar uma fruticultura de clima temperado em um clima tropical”, contou.
 
A HISTÓRIA DA MAÇà
A história do moderno cultivo da maçã no Brasil teve início no começo da década de 60, quando o grupo Viti-Vini-Fruticultura Evrard-Mahler, da Argélia, designou o especialista francês Roger Biau para o trabalho técnico de pesquisa e desenvolvimento da fruticultura no sul do país. Roger pisou em Fraiburgo pela primeira vez em julho de 1963, trazendo consigo diversas mudas de frutas para identificar qual delas se adaptaria melhor ao clima. Foram de 12 anos de experimentos, até o relatório final emitido em 1975 onde afirmava que o clima era propício para o desenvolvimento da maçã.
Até chegar a conclusão de que a maçã era a fruta indicada e ainda ter a missão de descobrir qual era a variedade que melhor se adaptaria, muitas foram as dificuldades por que passou. Quando chegou, nem o idioma falava e por isso, ele mesmo precisava preparar os terrenos de forma que ensinaria aos ajudantes através da prática como o trabalho deveria ser feito. Com muito trabalho instalou um pomar experimental de 42 hectares onde promovia os experimentos. Foram analisadas 525 espécies, sendo que destas 165 eram variedades de maçãs. 
O Pai da Maçã chegou à conclusão de que as variedades gala e fuji, além de adaptar-se ao clima brasileiro, seriam as melhores apreciadas pelo gosto do consumidor. Atualmente estas variedades ainda são consideradas as mais modernas no mundo, contrariamente do que na época se pensava de que as variedades de coloração verde teriam maior preferência.
Roger conta que veio para Fraiburgo com o objetivo de ficar apenas cinco anos, no entanto as pesquisas, que eram viabilizadas pela iniciativa privada através da família Frey, começaram a dar certo e ele não tinha como largar os experimentos que viviam o auge. Desta forma os anos foram se passando e para a França voltava somente a passeio.
 
UM CASTELO CONSTRUÍDO EM NOME DO AMOR
Sem se acostumar com a vida simples que passou a ter em Fraiburgo, Evelyne por diversas vezes, ameaçou que voltaria para o país de origem levando junto às filhas do casal. Foi então que Roger teve a ideia de oferecer que se a esposa desistisse do pensamento, a casa dos sonhos seria construída. Ela se interessou pela proposta, no entanto com ajuda de um arquiteto francês, elaborou um projeto audacioso que inicialmente chegou a assustar o esposo.
Mas para garantir a permanência da família no Brasil e o conforto do todos, com ajuda da família Frey foi edificado um dos grandes símbolos que torna Fraiburgo reconhecido: O Castelinho, local que residiram por várias décadas. O Castelinho foi construído utilizando o estilo das casas da Normandia (província a Oeste da França). Foram utilizadas pedras de Basalto encontrado na região (mais conhecida como “pedra-ferro”) e que foram cortadas à mão, transformando a casa em uma verdadeira fortaleza. A sua construção foi realizada por um francês trazido especialmente para executar a obra. 

O RECONHECIMETO DE FRAIBURGO

A repercussão da decisão do casal de franceses de voltarem definitivamente pela França, foi algo que rapidamente se espalhou entre os fraiburguenses. A maior parte, se não a totalidade ficou emocionada com o anuncio, mas sem muito questionar, pois é sábio a dedicação que Roger teve com o município. De maneira muito humilde disse que leva somente lembranças boas. “Sou muito grato ao povo brasileiro que me permitiu fazer esse trabalho, se não tivessem nos acolhido, isso não seria possível”, afirmou.
Fraiburgo parecia que pressentia que a volta do casal para a França se aproximava. Ainda no ano passado, Roger foi um principais homenageados no Desfile das Potencialidades. Entre as homenagens que as empresas prestaram ao município e o seu desenvolvimento econômico atingido nesse meio século de existência, um carro alegórico carregou o Pai da Maçã no Brasil, pela Rua Arnoldo Frey e emocionou a multidão de expectadores.
O amor que demonstra ter pela cidade que adotou por opção foi facilmente reconhecido. Entre as pessoas que ficaram emocionadas com a partida está Ari Antônio Guindani. “Conheci Roger em 1969, fui um dos que se influenciaram beneficamente com o seu entusiasmo e por isso vim parar em Fraiburgo. Tive a honra de tornar-me seu amigo. Além de um grande cientista este homem é um grande ser humano”, comentou.
Na década de 60, como a exploração das araucárias já não era mais tão abundante, a família Frey começou a explorar outras culturas, sendo as frutas de caroços e por fim a maçã. A iniciativa dos fundadores do município, aliado ao conhecimento do engenheiro agrônomo, fizeram com que Fraiburgo em apenas 50 anos alcançasse tão reconhecido desenvolvimento econômico.
Para Willy Frey, filho Renê Carlos e sobrinho de Arnoldo, que foram quem trouxeram Roger para cá, este é um momento de reconhecimento. “Roger prestou enorme trabalho e lutas na fruticultura de Fraiburgo, seu nome vai ficar gravado na história de nosso município. Desejamos que faça uma boa viagem de regresso a sua pátria e tenha uma merecida aposentadoria, feliz e tranquila”, disse.
FOTOS ARQUIVO PESSOAL E CINEGRAF IMAGENS


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